Big Brother Brasil, O Show de Truman e Platão

Afinal, estamos saindo da caverna ou apenas nos acomodando diante das sombras de um reality show como o Big Brother Brasil?

A televisão aberta brasileira, ano após ano, reafirma o sucesso do Big Brother Brasil. Tanto que em 2025 o programa chega à sua 25ª edição. Gostem ou não: o BBB continua sendo sucesso de audiência e de engajamento do público. Afinal, o programa continua atraindo uma infinidade de interessados em participar dele, sejam anônimos ou famosos, e de empresas dispostas a pagar altos valores para anunciar suas marcas no reality show.

Seguindo a onda de interessados pelo programa, minha namorada tem acompanhado o BBB, o que nos fez reassistir um dos filmes que mais dialogam com essa ideia de vigilância e entretenimento: O Show de Truman (1998), de Peter Weir. Ao assistir novamente à jornada de Truman Burbank, interpretado por Jim Carrey, que descobre ser o protagonista involuntário de um reality show e tenta escapar dessa prisão televisiva, a relação com A República de Platão se tornou inevitável para mim.

Sendo formado em filosofia e tendo Platão como um dos meus filósofos de cabeceira, sempre enxerguei O Show de Truman como uma releitura contemporânea do Mito da Caverna, um dos conceitos centrais de A República. No diálogo platônico, os prisioneiros estão acorrentados dentro de uma caverna, vendo apenas sombras projetadas na parede, acreditando que essa é toda a realidade existente. Quando um deles se liberta e sai da caverna, percebe que o mundo real é muito mais amplo e complexo do que as imagens distorcidas que sempre conheceu.

Em O Show de Truman, Jim carrey dá vida a Truman Burbank.

Essa metáfora do conhecimento e da libertação do engano se reflete perfeitamente na trajetória de Truman. Desde o nascimento ele vive dentro de um estúdio televisivo, controlado por um onipotente diretor de televisão chamado Christopher (Ed Harris). Sendo assim, Truman nem desconfia que sua realidade é manipulada e transmitida ao mundo como um grande espetáculo. Ele simplesmente a vive de forma espontânea e natural, considerando como tudo aquilo sendo verossímil.

O Big Brother Brasil e outros reality shows modernos trazem essa inquietação filosófica para a vida real, mas com uma reviravolta: os participantes, diferentemente de Truman, sabem que estão sendo observados. No entanto, isso não significa que estejam livres da caverna. Na era das redes sociais e da busca incessante por fama, o reality show se torna uma nova caverna contemporânea, onde os confinados moldam suas personalidades de acordo com a expectativa do público e das edições feitas pela produção.

Tal como Truman que demora a perceber que está sendo manipulado, muitos dos participantes do BBB se iludem com a ideia de espontaneidade. Afinal, acabam não fazendo nada mais do que parte de um jogo cuidadosamente estruturado. E que visa gerar engajamento nas redes sociais e sites de fofoca através de narrativas dramáticas e polêmicas.

Na pintura A Escola de Atenas, Platão e Aristóteles são retratados juntos.

Enquanto Truman desafia seu destino e atravessa o oceano para descobrir o que existe além do horizonte, os prisioneiros de Platão que conseguem sair da caverna enfrentam outro dilema: ao voltar para libertar os outros, são ridicularizados por aqueles que ainda acreditam na ilusão das sombras. Algo semelhante acontece quando refletimos sobre o poder da mídia e da realidade fabricada: aqueles que tentam desmascarar o sistema são vistos com desconfiança, enquanto o espetáculo continua cativando milhões.

Talvez a conclusão deste texto devesse sugerir que aqueles que assistem ao programa buscassem algo mais enriquecedor, algo que elevasse o espírito, que permitisse sair da caverna ou, no mínimo, perceber as falhas na matrix. No entanto, essa recomendação soaria como um moralismo banal e redundante. Afinal, em uma confissão pessoal, depois de um dia exaustivo e estressante, eu mesmo muitas vezes me jogo no sofá e fico acompanhando o programa, mesmo nos momentos mais monótonos e desinteressantes dele.

No fim, tanto Platão quanto O Show de Truman e o próprio Big Brother Brasil nos fazem pensar sobre o que consideramos real e até onde estamos dispostos a questionar as verdades que nos são apresentadas. Afinal, estamos saindo da caverna ou apenas nos acomodando diante das sombras na tela?

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